Por Alexandre Teixeira, Advogado, Economista – Preside o Instituto Mais Cidades e a Comissão de Compliance, Integridade e Combate e Corrupção/OAB-RN
Introdução
No Brasil, a concorrência entre empresas em processos licitatórios é fundamental para assegurar uma seleção justa e eficiente de fornecedores. No entanto, é evidente que a atual situação revela distorções preocupantes. O fenômeno do "dumping" de preços tem sido amplamente observado, no qual empresas com baixa qualificação técnica e financeira apresentam propostas excessivamente reduzidas, muitas vezes abaixo dos custos reais da obra. Essa prática é motivada pela necessidade de vencer a concorrência, ignorando as exigências técnicas e a capacidade de execução do projeto.
Essa prática, tem gerado consequências negativas tanto para a qualidade das obras quanto para a administração pública, em especial nos convênios e contratos de repasse executados pelos Municípios Brasileiros. Hoje, é comum que essas empresas após vencerem licitações pressionem os órgãos responsáveis a realizar reajustes de preço antes mesmo do início das obras, comprometendo ainda mais a eficiência e a transparência dos processos licitatórios. Empresas vencedoras dos processos licitatórios argumentam que os valores contratados não são suficientes para cobrir os custos reais e buscam obter aditivos contratuais que aumentam os gastos. Esse comportamento afeta diretamente a administração pública, uma vez que a alegação de falta de recursos pode resultar em atrasos, paralisações e até mesmo na não conclusão das obras.
E é exatamente aí onde os Gestores se veem entre a cruz e espada, pois, uma vez que a licitação é aprovada e depositado o montante relativo a 1ª Parcela pelo órgão concedente do recurso, começa a correr os prazos estabelecidos no artigo 41, III, § 7, 8 e 17 da portaria interministerial 424/2016, onde em apertada síntese dispõe que: “havendo inexistência de execução financeira no após 180 da liberação da primeira parcela, ou do mesmo prazo no transcurso de sua execução o instrumento deverá ser rescindido e o valor juntamente com seus rendimentos deverão serem devolvidos”.
Outro ponto muito importante, que agrava ainda mais a vida econômica e de políticas públicas, está previsto no texto do parágrafo § 15 “É vedado o início de execução de novos instrumentos e a liberação de recursos para o convenente que tiver instrumentos apoiados com recursos do Governo Federal sem execução financeira por prazo superior a 180 (cento e oitenta) dias.” Ou seja, não obstante todo prejuízo causado na execução da obra que a empresa deixou de cumprir, causando prejuízo para a administração e coletividade, abre-se ainda mais a cratera desse prejuízo coletivo a população, colocando aquele órgão ou município em uma lista negra, causado também uma paralização administrativa. E nós, Gestores Públicos, Operadores do Direito e Sociedade, não podemos fechar os olhos para tudo isso.
Embora posteriormente o Governo Federal tenha editado seu texto por meio das portarias 277/2017 e 558/2019 inovando no seu conteúdo e abrindo possibilidades de prorrogação dos prazos, visto que é recorrente essa problemática nos municípios brasileiros. Entendo que, o texto não se mostra suficiente uma vez que, caso o convenente não se enquadre nos critérios objetivos, 1- atraso de liberação de parcelas pelo concedente ou mandatária, 2- paralisação da execução por determinação judicial ou recomendação/determinação de órgãos de controle, fica mercê da subjetividade da análise caso a caso, ou seja dependendo também do humor daquele que analisa, quer seja, do corpo técnico ou jurídico do concedente/mandatária.
Dessa forma, como nesse momento alterar a nova lei de licitações (14.133), que inclusive nem teve sua positivação completa em virtude da prorrogação da 8.666, não se mostra um caminho fácil, me parece razoável alterarmos o texto da Portaria 424.
Nessa Diapasão, encaminhamos para o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, uma proposta de alteração da portaria (Processo nº: 14021.155014/2023-21), onde acrescentar-se-ia um inciso no Parágrafo 19 do artigo 41, com a seguinte redação: “deverão ser suspensos nos casos em que a inexecução financeira for devida a distrato do contrato licitado, em que a convenente comprove que não deu causa.”
Conclusão
Os desafios enfrentados nos processos de licitação de obras no Brasil, como a participação de empresas menos qualificadas, a prática do "dumping" de preços e a pressão por reajuste antes do início das obras, evidenciam a necessidade de aprimorar a gestão pública por meio de normativos mais conectados com a realidade. É fundamental que os princípios da administração pública sejam perseguidos, assegurando a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência nos processos licitatórios.
A Portaria Interministerial 424/2016 representa um instrumento importante para a gestão dos contratos de obras, a correta aplicação desse dispositivo contribui para a transparência e a eficácia na execução das obras. A inclusão do texto proposto representará um avanço na correção dessas distorções mitigando os problemas decorrentes das pressões financeiras e garantindo a qualidade dos empreendimentos públicos, sem prejudicar o interesse da coletividade e da busca pelo bem comum.
O Brasil precisa mudar a cultura de agir nos efeitos, para procurar identificar a verdadeira causa e corrigi-la, sendo necessário se criar um ambiente de estabilidade e segurança jurídica para o Brasil Real, que todo dia sofre com esses desencontros do Brasil Oficial.